Recomeço na indústria: ex-funcionária da Ford retoma carreira na nova fábrica da BYD em Camaçari
Aos 44 anos, Daniela Menezes vive um novo capítulo em sua trajetória profissional. Moradora de Camaçari, na Região Metropolitana de Salvador, ela voltou a vestir o uniforme da indústria automotiva após ser contratada pela montadora chinesa BYD, que se instalou no mesmo complexo onde funcionava a antiga fábrica da Ford, desativada em 2021. Com duas décadas de experiência no setor, Daniela passou anos tentando se recolocar no mercado, até conquistar a vaga de líder de logística na nova planta da empresa.
“Desejava muito voltar ao setor automotivo. Os primeiros dias na BYD têm sido eufóricos. É tudo muito maior — só o primeiro galpão já tem quase o tamanho da antiga fábrica inteira”, relata Daniela, que foi selecionada através da plataforma Gupy após um processo iniciado em dezembro. Para ela, a contratação representa mais que uma conquista pessoal. “É também a esperança de um futuro melhor para a cidade”, afirma.
Daniela faz parte do grupo de cerca de mil pessoas já contratadas pela BYD na Bahia. Somente em julho, a empresa abriu mais de mil novas vagas — metade através dos sistemas SineBahia e CIAT, e a outra metade via plataformas online. A expectativa é que o complexo industrial da montadora gere até 20 mil empregos diretos e indiretos até 2027, movimentando a economia local e fortalecendo setores como comércio e serviços.
Com um investimento estimado em até R$ 6,5 bilhões, a instalação da BYD em Camaçari insere a Bahia em um novo ciclo de industrialização focado em tecnologias limpas. A iniciativa também está alinhada com as projeções globais para a eletrificação dos transportes. Um estudo do ICCT Brasil (Conselho Internacional de Transporte Limpo), com apoio do Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (PNUMA), aponta que o Brasil pode dobrar o número de empregos até 2050 se investir na cadeia produtiva de veículos elétricos, incluindo baterias, componentes e qualificação profissional.
“As vendas de elétricos já começaram a crescer no Brasil. Mas precisamos olhar também para os impactos sociais e econômicos dessa transição”, afirma Marcel Martin, diretor-executivo do ICCT Brasil. Segundo ele, apesar da retração esperada em setores tradicionais como combustíveis fósseis e autopeças, haverá expansão em áreas como engenharia, serviços técnicos, logística e manufatura de alta tecnologia.
O estudo destaca ainda que o valor agregado à economia será 85% maior em um cenário de eletrificação, com distribuição de renda mais equilibrada: 53% direcionada a salários, contra os atuais 45% no modelo baseado em combustíveis fósseis.
A Bahia, com sua tradição automotiva, mão de obra especializada e infraestrutura logística, desponta como um dos polos mais promissores dessa transformação. “A produção de veículos elétricos está em linha com os desafios da neoindustrialização, podendo ser um importante motor para a construção de uma economia sustentável na Bahia”, avalia Marcus Verhine, gerente-executivo de Desenvolvimento Industrial da Fieb (Federação das Indústrias do Estado da Bahia). Segundo ele, o compromisso da BYD com pesquisa e inovação deve fortalecer a competitividade da indústria local.
Para preparar a força de trabalho, a BYD já firmou parcerias com instituições como o Senai e o IFBA. De acordo com Rodrigo Rosseto, gerente sênior de Recursos Humanos da empresa, a meta é absorver talentos locais, priorizando ex-funcionários da Ford e jovens em formação. “Queremos criar uma base sólida e socialmente responsável”, destaca.
O impacto da nova fábrica já começa a se refletir também em outros setores. Um novo hotel da rede Ibis será construído em Camaçari, com previsão de gerar 35 empregos na construção civil e outros 20 na operação hoteleira. “Com mais de 10 mil empregos estimados, cresce também a demanda por serviços como hospedagem, alimentação e transporte”, observa Guilherme Reis, gestor comercial da PPA Real Estate, responsável pelo projeto.
A história de Daniela Menezes é um retrato das possibilidades que se abrem com a retomada da industrialização sustentável. “A chegada da BYD pode mudar o destino de muitas famílias aqui. Mas é preciso que as oportunidades sejam acessíveis e que haja espaço para todos — jovens, mulheres, pessoas mais velhas como eu, que sempre procuraram se qualificar”, conclui.