Desapropriação gera polêmica em Praia do Forte envolvendo Ex-Prefeito e suspeitas de improbidade

Moradores de Praia do Forte, distrito turístico de Mata de São João, foram surpreendidos no último dia 13 de maio com uma publicação no Diário Oficial do município que anunciou a desapropriação de um terreno para a construção de um campo de grama sintética. O que causou perplexidade na comunidade é que o campo em questão já havia sido inaugurado em novembro do ano passado.
Segundo o decreto municipal, a área de 6.232 m² será indenizada em R$ 6 milhões, valor que será dividido entre as empresas Atual Participações Ltda (R$ 4 milhões) e PFM Participações Ltda (R$ 2 milhões). A operação, no entanto, levanta suspeitas: a Atual tem como sócio-administrador o ex-prefeito João Gualberto, e o atual prefeito, Agostinho Batista dos Santos Neto, o “Bira da Barraca” (União Brasil), era seu vice até a renúncia de Gualberto em dezembro de 2023.
O campo foi construído com recursos públicos em um terreno que ainda era privado e só teve sua utilidade pública decretada em 6 de maio deste ano — uma semana antes da publicação do decreto de desapropriação. Especialistas ouvidos pelo jornal A TARDE, que preferiram não se identificar sem acesso ao processo completo, apontam que a aplicação de recursos municipais em propriedade particular pode configurar improbidade administrativa e, eventualmente, resultar na perda de mandato.
A presidente da Associação de Moradores de Praia do Forte, Madja Reis, afirma que o terreno sempre foi entendido como área pública pela comunidade. “Era um campo de terra usado há décadas. Ficamos surpresos com a desapropriação. Para nós, sempre foi área da população, uma contrapartida cedida por Klaus Peters quando represou a lagoa Timeantube”, disse ela.
Klaus Peters, paulista filho do alemão Martin Peters, foi um dos fundadores do projeto turístico da região. Em 1970, adquiriu 30 mil hectares de terras na região, que incluíam áreas de mata, praia e rios. Em 2008, ano em que João Gualberto foi eleito prefeito, Peters e a empresa Landco venderam 28.136,29 m² da chamada Fazenda Praia do Forte por apenas R$ 100 mil — parcela que incluía o campo hoje desapropriado. A Atual ficou com 66,6% e a PFM com 33,3% da área.
Na época, a cessão em comodato ao município, que permitia o uso do terreno pela comunidade, foi desfeita. Um distrato foi registrado em cartório em 2011, e o então prefeito em exercício, Otávio Marcelo Matos de Oliveira, assinou um decreto autorizando o desmembramento da área, consolidando sua posse pelas empresas.
Personagens envolvidos na transação chamam atenção. Alberto Bolzico, representante da Landco e arquiteto de empreendimentos ligados a Gualberto, e Jorge Tadeu de Souza, procurador de Klaus e representante das duas empresas beneficiadas, aparecem em documentos da negociação. José Humberto Souza, que representou a Atual no contrato, é citado na declaração de bens de Gualberto em 2014 como beneficiário de um empréstimo de R$ 500 mil do ex-prefeito. Já a PFM pertence a André Pedreira de Freitas, sócio do grupo Enseada, responsável por empreendimentos de luxo em Praia do Forte.
Enquanto o campo de grama sintética era construído em 2023, outra porção da Fazenda Praia do Forte — com 20.795 m² — foi vendida por R$ 4,55 milhões para a LN Vila Incorporação SPE Ltda, onde está sendo erguido o condomínio de alto padrão “Mamanuca Praia do Forte”. A área vendida é mais que o triplo da destinada ao campo, mas foi negociada por um valor 25% menor, o que reforça questionamentos sobre a avaliação e a motivação da desapropriação feita pela prefeitura.
A situação continua gerando indignação entre os moradores e levantando dúvidas sobre a legalidade e transparência da operação que envolve figuras públicas e interesses privados. A comunidade aguarda esclarecimentos e possíveis desdobramentos judiciais.